Deixe a luz passar!

Deixe a luz passar!
Fiat lux!!!

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Oniricamente!

 Em pleno calor de outubro acordei com frio. Pensei ter pego um resfriado, mas à medida em que despertava ia percebendo que o ar estava realmente frio. Ao levantar e tocar os chinelos, constatei o que já suspeitava: estavam gelados. Recolhi os pés e pisei no tapete de barbantes de algodão. Arrastei-me junto com o tapete e peguei um par de meias no armário. Vesti uma calça, camisa e casaco e calcei os sapatos para enfrentar o dia. Seis e meia. Às oito eu estava dentro do ônibus e por mais que me esforçasse não conseguia lembrar de qualquer uma daquelas pessoas. Era curioso, pois todos os dias as quase quarenta pessoas eram quase sempre as mesmas. Uma ou outra cara diferente, mas a maioria se conhecia, pelo menos de vista. Nem o motorista era o mesmo. Dos quase quarenta passageiros habituais, havia apenas mais cinco pessoas e eu. Não as conhecia. Chequei o horário e eram oito e cinco. Batia. 
O ônibus rodou mais de cinco minutos e ninguém subiu ou desceu. Assustado, resolvi descer três quadras antes do meu local de trabalho. Acionei a campainha e me dirigi à porta para descer, tão logo o carro parasse. Não parou. Olhei para o motorista e só então percebi nele uma nítida apatia. Dirigia de maneira autômata. Ignorou minha solicitação de parada e nem sequer me olhava. 
Quando dei por mim estava quase sendo acuado pelos outros cinco passageiros e foi aí que tudo começou a fugir ao controle, pois o motorista, antes apático, agora me olhou. Antes não o tivesse feito. Senti uma onda gelada percorrer todo o meu ser ao me deparar com aqueles olhos cinzas, opacos e pequenos. O efeito se intensificou ao ver a transfiguração dos rostos desconhecidos em algo mais aterrorizante.  Suas faces assumiram uma forma mista de leão sem boca e com um nariz que se assemelhava à extremidade de uma minhoca, com um pequeno orifício, imitando uma pequena tromba que se mexia sem parar, como que tateando o ar a procura de um cheiro específico. Senti-me encolhendo e ficando menor a cada instante, sucumbindo frente à ameaça cada vez mais próxima.  Um deles se aproximou a ponto de me tocar, ouvi um zumbido forte e um aroma de pêssego saindo de sua tromba e desmaiei. 
Acordei com um empurrão forte e uma voz irritada mandando eu levantar e desligar o despertador que alarmava irritantemente. 
Coisa chata é pesadelo, não?

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

A rosa!


Não tive tempo de repensar tudo quanto se passara por minha cabeça e imaginação. Tudo parecia tão calmo e no lugar que fui enganado pelos sentidos treinados. Não pude avaliar o que me impelia na sua direção. Apenas ia e isso bastava. Sua magia era forte o suficiente para mover mente e músculos onde quer que estivessem.  Havia nela algo além da beleza estampada. Não sabia o que era, mas sentia uma estranha compulsão de vê-la, tocá-la, amá-la enfim. Seu sorriso cheirava a macelinha e nele eu adormecia do cansaço. Mas era mais que isso, era transcendência e tudo que isso possa significar.
Dei-lhe uma rosa e ela chorou. Não foi um choro ruim, foi um choro alegre, motivado pelo simples ato de receber a flor. Ela disse que a flor era a sua preferida e me abraçou ternamente, suavemente. Eu a apertei forte entre os braços e o batente da porta até me dar conta de que podia estar lhe causando alguma injúria. Relaxei o abraço e a beijei nos olhos, drenei as lágrimas e disse que sabia de sua preferência, por isso a trouxera. Uma flor tem um poder imensurável de fazer uma mulher chorar, mesmo quando sua intenção é só lhe fazer feliz; a rosa é a campeã. Acho que o choro para o homem seja diferente, está ligado à dor e outros sentimentos negativos, como perda, por exemplo. Mas para a mulher não, tem outros significados, é muito mais ligado aos positivos que aos negativos pontos da vida.  
Hoje eu quis lhe dar outra rosa. Saí à sua procura pela cidade, sabia que ela estava lá, em algum lugar discreto, escondido dos olhares curiosos, mas não tive competência suficiente para achá-la. Pensei tê-la visto em um café, sentada próxima ao caixa, conversando com alguém, mas não tive certeza, ando meio atrapalhado pela ausência do seu cheiro, do seu caminhar e de nós.  Contento-me agora só com o eu e tento ler um livro biográfico sobre Galileo Galilei.
Nem uma coisa, nem outra. Mas sei que a rosa é real.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Aqueles olhos!

Aqueles olhos, amêndoas,
Que devoravam bocas,
Que devoravam bocas,
Que tragavam o azul do mar,
Que sugavam a luz
dos Ipês amarelos de agosto,
Que brilham!

Aqueles olhos, amêndoas,
Que me olharam,
Que me seduziram,
Que me devoraram,
Que me diziam tudo, calados!

Aqueles olhos, amêndoas,
Que me desguiaram,
Que me emocionaram,
Que se emocionaram.

Aqueles olhos, amêndoas,
Lua que minguava
No meu olhar.

Aqueles olhos, amêndoas,
Que transbordavam emoções
úmidas e mal contidas.

Aqueles olhos, amêndoas,
Comestíveis,
Doces.

Aqueles olhos, amêndoas,
Ume!

Aqueles olhos, amêndoas,
Sakura!

Aqueles olhos, amêndoas,
Momo!

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Foi assim...


Com os pés travados na lama
Com as mãos enterradas na areia
Com os olhos presos ao céu
Com a língua presa na resposta

Com os neurônios arrebentados
Com as sinapses mal feitas
Com as conexões atrasadas
Com os cabos soltos

Com a fibra rota
Com a caixa aberta
Com a luz cortada
Com o tempo certo

Com tudo
Com gado
Com sina
Com nada

Com ontem
Com hoje
Com plexo
Sem tempo

Passo a passo!