Houve uma proposta de caminhada
Mantendo os trapos que já não cobriam a
pele do frio.
Os estômagos rugiam ferozes da fome que
já não tinha nome.
Os olhos não sabiam para onde olhar.
Por isso, nem viam o verde .
Só o marrom da terra que subia com cada
ventania.
Não era possível falar, nem sequer
lamentar.
A estrada era de degraus amplos.
E a cada passo um tropeçar.
E a cada tropeço um pedaço de dedo
estraçalhado.
A parada era de cansaço pleno.
Não havia sono, era uma quase morte
noturna e nem sempre era.
Às vezes, sem ânimo, era morte mesmo.
Duas mortes plenas a cada dia sem rumo.
As mãos queriam estar sempre unidas, se
achavam até na distância.
Corriam e reconheciam topograficamente
cada cicatriz herdada das pedras.
Os pés queriam parar, mas sem saber
como, continuavam a ditar os passos.
E eles seguiam trôpegos.
Ele um dia perguntou qual seria o
próximo passo.
Por não saber ou saber demais, ela
respondeu não saber.
E por não saberem, continuaram calados
e sem destino certo.
Agora só ostentavam as feridas nuas e
cruentas.
Havia olhares de nojo e desprezo onde
estivessem.
Mas por terem dito que continuariam,
continuavam.
Não haveria quem os reconhecesse.
E ela o querendo sempre.
Ele não sabia qual era o propósito
daquele querer.
Então, por ignorância, continuava.
O que queimava não era o sol de cada
dia, senão uma dúvida cruel que ainda o acompanhava, só.
As peles já não se reconheciam pelo
toque, só pela dor da falta.
Não havia taquicardia pela proximidade
excessiva.
Por acaso os olhares se encontravam.
Então oravam juntos uma prece deles, só
deles.
Na curva do cerro azul se separaram e
se foram.
A chuva que caiu apagou cada passo
e
cada lampejo de memória.
Sobrei eu, que tento contar sua
história de perguntas e vivências vãs, tristes.
Nunca mais os vi, desde a curva.
E já quase nem me encontro mais.
Ter-se com os outros, perder deles, perder-se de si mesmo. Olhar os passos de quem vai e aprender a ir também. Espelhamo-nos
ResponderExcluira vida inteira.
Um abraço.
Li, mas não consigo comentar agora. Desde o final do ano que escrevo sobre caminho, e ao me deparar com a primeira imagem, fui indo de charrete...depois li o texto e me vi entrelaçada nesse texto, no caminho, nos caminhos..Agora sigo....e voltarei para ler com mais calma.
ResponderExcluirabraços
...e pensar que neste exato
ResponderExcluirinstante em que te leio,
muitos pés estraçalhados,
carcomidos, encardidos pela
poerenta estrada, caminham
cansados e na certeza de
que não terão onde chegar,
senão à exaustão do viver,
incerto viver,
perdendo-se às vezes,
na ilusão de um olhar faminto,
não se sabe de quê.
beijos, muitos deles.
Zé, que lindo!
ResponderExcluirVi-me como caminhante nesta estrada, a perder-me, encontrar-me, a não saber-me...
Preciso colocar minha leitura em dia. Desculpa a ausência, êta vidinha complicada essa minha: Mas é aquela velha novela: final de mês, faço jornal filantrópico onde sou jornalista, redatora, editora, diagramadora (e todos os oras que vc lembrar), aliado às festas de fim de ano, aniversário da Gabi (minha filha)e acabei negligenciando meus amigos queridos.
Agora estou voltando!
Saudades e beijocas
Tão assustador e realístico como o fim da infância. De igual modo aquela canção antiga, do Emerson, Lake & Palmer: C'est la vie.
ResponderExcluirUm dos seus melhores, Zé.
Cambio e desligo.
Um abraço!